Recebi por obra do acaso um correio eletrônico enviado por um amigo meu em tom de provocação, que continha o conteúdo extraído de uma página da internet com um curioso título “A elite da elite”.
Detive-me alguns instantes na leitura de um texto que parecia ser uma espécie de manifesto – um tanto pedante e arcaico – contra as denominadas “elites orgânicas” de nosso país, assim definidas como “organizações políticas pára-partidárias (sic) dedicadas à reprodução da dominação burguesa na sociedade capitalista. Reúnem [essas organizações] em seu seio a vanguarda dos empresários, tecno-empresários (sic), intelectuais, militares e políticos (estes com menor expressão) que se empenham em elaborar a estratégia política (em sentido lato) para garantir a viabilização (sic) prática dos interesses do grande capital na sociedade, com táticas adequadas a cada momento histórico.”
Mais adiante veio a surpresa, que aqui reproduzo para divertimento (ou desilusão definitiva) de todos. Afirmava o manifesto que “No Brasil de hoje, existe uma organização que pode ser identificada como a principal elite orgânica capitalista em atividade: o Instituto Millenium. Esta organização que se constitui como “um centro de estudos, pesquisa, divulgação e formação em assuntos públicos de governo, política, economia, sociedade e cultura, que promove os valores e princípios de uma sociedade livre – liberdade individual, direito de propriedade, economia de mercado, estado eficiente, democracia representativa, estado de direito e limites institucionais à ação do governo”, deixa claro que o objetivo dos membros do grupo é “alcançar o público formador de opinião e o público em geral para garantir que nos tornemos uma força efetiva e poderosa em nome da liberdade econômica, política e cultural. A idéia, portanto, não é apenas produzir pesquisa, mas apontar soluções consistentes com nossa visão e divulgá-las.”
Mas o ápice da emoção ainda estava por vir. Ao final do texto recomendava-se acompanhar atentamente “os movimentos realizados pelo Instituto Millenium enquanto (sic) força efetiva de organização e mobilização dos interesses do grande capital” e, para comprovar o quanto se acabara de afirmar, enunciava-se uma lista dos principais integrantes do instituto, dentre os quais figuras brilhantes como Paulo Guedes, Jorge Gerdau, Eduardo Viola, João Roberto Marinho, Pedro Henrique Mariani, Modesto Carvalhosa e outros mais, inclusive alguns de menor brilho, como eu.
Foi assim, da maneira mais inesperada possível, que descobri o privilégio de fazer parte do Millennium. É engraçado como determinadas verdades são por vezes reveladas através de fatos absolutamente corriqueiros e sem importância alguma, como o texto ao qual acabei de me referir. Adorei ser chamado de “elite da elite”. Senti-me orgulhoso ao ver meu nome ao lado de pessoas que eu admiro e respeito. Experimentei, enfim, uma enorme satisfação ao perceber que faço parte de uma elite e, mais, de uma elite verdadeiramente orgânica, que se mobiliza para mudar a triste realidade deste País, após séculos de absoluta inércia e conformismo.
Mas ao lado da satisfação que o manifesto me proporcionou veio também a descoberta, ou melhor, a comprovação de que de fato existe gente que é contra democracia, livre iniciativa, estado eficiente e liberdade individual. Existe, de fato, gente que pensa que é ruim ou criminoso ser bem-sucedido e vê o “grande capital”, como uma espécie de satanás a ser combatido.
Enfim, é curioso que, em um governo de esquerda, eleito pelas camadas menos favorecidas da população, sejam os empresários referidos como elite, até porque o termo elite vem do latim eligere, (eleger, escolher) e, nenhuma das pessoas referidas pelo comentarista exerce qualquer cargo eletivo.
Portanto, a elite da elite, no sentido pejorativo da palavra, são todos aqueles que, tendo sido escolhidos ou habilitados para desempenhar função pública, ignoram a imensa responsabilidade dos cargos que ocupam, fartando-se de benesses e privilégios de toda sorte. Nós, a quem eles chamam de elite, acordamos cedo para ganhar o pão de cada dia, trabalhamos 4 meses por ano só para pagar impostos, não recebemos em troca qualquer dos serviços essenciais, como educação, saúde e segurança, mas ainda assim persistimos na luta por acreditar que um país de verdade se faz com valores fundamentais e com muito trabalho árduo.
Termino este texto, portanto, com a mesma advertência daquele que lhe deu origem ou que lhe serviu de inspiração. Sugiro acompanhar com muito cuidado e atenção todos os movimentos da verdadeira elite, aquela escolhida pelo povo, que além de ter uma apetite insaciável por recursos públicos, não esconde sua antipatia por aqueles que trabalham.
Talvez conheça o texto “Uma Mensagem a Garcia” (tem uma boa transcrição em http://www.stetnet.com.br/puglisi/Mensagem_a_garcia.htm). O texto faz uma oposição entre patrão e empregado (tão ao gosto de LULA), mas dessa vez defendendo o patrão:
“Nada se diz do patrão que envelhece antes do tempo, num baldado esforço para induzir eternos desgostosos e descontentes a trabalhar conscienciosamente; nada se diz de sua longa e paciente procura de pessoal, que, no entanto, muitas vezes nada mais faz do que ‘matar o tempo’, logo que ele volta as costas.”
Hoje, no Brasil, somente a teimosia em “acreditar que um país de verdade se faz com valores fundamentais e com muito trabalho árduo” faz com que alguém abra uma firma.
Não há oposição entre capital e trabalho (exceto na cabeça do idiota do K Marx). Ao abrir as portas, uma firma gera postos de trabalho que serão ocupados por pessoas cujos salários movimentarão a economia. O verdadeiro opositor do povo não é a “elite empresarial”, que é quem lhe dá emprego (embora deixar o dinheiro aplicado no banco fosse mais rentável e evitaria mil problemas e dores de cabeça).
O opositor do povo são seus eleitos, que lhe roubam de toda forma enquanto culpam o outro. São como trombadinhas que apontam um inocente enquanto lhe batem a carteira.
Parabéns pelo texto.
Sempre vai haver alguma forma de elite, mas quando a elite é pró livre mercado, capitalista e empresarial, o povo vai ser beneficiar MUITO mais do que quando a classe política é quem manda.
O capitalista é honesto, ele quer melhorar sua condição mas ele deve entregar algo em troca, na forma de produtos e serviços úteis, não adianta só prometer e ser carismático. Empresário carismático e incompetente vai logo a falência.
O certo é falar mal da OUTRA elite – da dobradinha entre políticos de carreira (alguns são até bem intencionados mas existem conflitos de interesse inerentes na profissão) e os capitalistas de estado (empresários que dependem de subsídios/favores), esses sim podem se beneficiar a si mesmos sem entregar NADA em troca. Uma espécie de roubo legitimado, que é aceito por todos como regra.
“existe de fato gente que….vê o “grande capital” como uma espécie de satanás a ser combatido”. Mas, meu caro Andres, é muita gente, e em todos os países, civilizados, ou não. E tem mais, essas pessoas compõem, no Brasil, Estados Unidos, FRANÇA, ou em toda a Eurábia, grande parte dos scholars, grande parte da elite intelectual. São muito inteligentes, mas falta-lhes lucidez. Esse é um extraordinário fenômeno contemporâneo.