Ao contrário do que meus alunos (e leitores) pensam, sou um grande admirador da economia e política cubanas. Hoje, por exemplo, li no “O Estado de São Paulo”, uma tradução de matéria do “The Washintgon Post” sobre a ilhota favorita dos militantes esquerdistas do Brasil. O tema? A economia clandestina de Cuba. Um trecho, em especial, merece ser transcrito. “A próspera economia clandestina funciona como um bolsão de capitalismo, guiado pela oferta e pela procura, no único Estado comunista do Hemisfério Ocidental. Observadores dizem que ela pode ser precursora de um movimento rumo a uma economia de mercado, que poderia se acelerar depois da morte do presidente Fidel Castro; por outro lado, afirmam eles, o mercado negro pode ser simplesmente um subproduto de um sistema que recompensa quem é esperto e tem boas relações”. [O Estado de São Paulo, 29.10.2006, p.A15] O final do parágrafo é fascinante: quem é “esperto” e “tem boas relações” prevalece sobre quem é mais eficiente, impessoal. É exatamente o problema que Gary Becker chama de “crony capitalism”, um misto de economia de mercado com incentivos que privilegiam as relações com os donos do poder político às relações com os consumidores. Neste tipo de regime, diz Becker, os consumidores perdem mais em bem-estar do que em um mercado competitivo. Não é difícil ver o porquê, embora muita gente goste de tapar o sol da evidência com uma grossa peneira ideológica. Muitos “formadores de opinião” (acadêmicos, jornalistas, artistas, etc) são os mais entusiasmados defensores deste capitalismo de padrinhos. O discurso é mais ou menos assim: se um sujeito se preocupa com sua felicidade – o (mal)dito “individualismo” – é um decrépito, safado. Já um que leve em conta as relações pessoais é “mais humano”. Por exemplo, se um sujeito pretende vender pipocas a um preço mais baixo, ele é, na opinião de alguns destes formadores, um egoísta/individualista. Por outro lado, se ele montar um cartel com outros pipoqueiros para aumentar o preço da pipoca, diz-se que tem “preocupação social”. Sei que o leitor pode achar isto um exagero, mas o raciocínio é exatamente este. A questão é que alguns formadores de opinião só se utilizam de alguns exemplos, ignorando os que mostram a inconsistência de seu – absurdo – argumento. Mas continuando em minha admiração pela ilhota, podemos pensar em outro exemplo, adaptado à nossa realidade tropical, tupiniquim e – por que não? – selvagem. Um governo que aumenta sua participação na economia, segundo um dito “pensamento convencional” (também conhecido como lógica matemática elementar, pouco familiar aos militantes das causas ideológicas…), automaticamente diminui a participação do setor privado na mesma. Isto quer dizer que há mais padrinhos do que apadrinhados ou que as regras para os não-apadrinhados podem estar em processo de progressiva complexificação. Em outras palavras, fica cada vez mais difícil para um sujeito que deseja trabalhar como empresário não recorrer aos burocratas, senhores das leis e da arrecadação. Se as amarras legais ao poder dos burocratas não surtem efeito, a situação pode inclusive ser pior para os burocratas honestos (eles existem, obviamente, tanto quanto os empresários desonestos). Isto porque brigas políticas são constantes no setor público. No setor privado, claro, isto também existe, mas o preço a ser pago é mais alto: perde-se o emprego. No setor público, funcionários que erram ou sabotam políticas públicas nem sempre são punidos. A economia brasileira pode alcançar o grau de ineficiência de sua similar cubana sem mudar seu sistema econômico para o tal “socialismo”? Pode. Basta manter instituições ruins e contar com formadores de opinião de má qualidade. Ao ler os jornais, vejo que o caminho da servidão continua sendo eficientemente pavimentado por muitos de meus compatriotas, alguns ingênuos, outros mal-intencionados. Dá vontade de dizer, em alto e bom tom: “Brasil, amo-o e, por isto, deixo-o”. A depressão é muita para um indivíduo só e, nestas horas, a tal sociedade nunca vem em meu socorro. Sobra só o indivíduo, sozinho, com seus problemas…
A maravilhosa economia cubana: ainda chegaremos lá!
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