A economia nasceu como uma ciência política, o estudo dos esforços produtivos de uma sociedade. A natureza humana, os costumes sociais, a moralidade, o espectro da miséria ante as pressões demográficas, a riqueza das nações, os conflitos entre a aristocracia latifundiária, os comerciantes e a indústria manufatureira, a distribuição de renda e o comércio internacional eram objetos de análise dos primeiros “economistas”, como David Hume, Thomas Malthus, Adam Smith, François Quesnay e David Ricardo. Os assuntos eram extraordinariamente relevantes, mas os métodos analíticos, ainda incipientes.
O extraordinário progresso científico alcançado pelo uso intensivo de uma linguagem matemática cada vez mais avançada na experimentação e mensuração dos fenômenos naturais mudou tudo isso. Duas vezes rejeitado pela École Polytechnique, reprovado na École des Mines, Leon Walras dedicou-se sob a inspiração do pai ao transplante da metodologia capaz de capturar o movimento dos planetas à explicação científica dos fenômenos econômicos. Os economistas queriam ser tão precisos e exatos quanto pensavam que fossem os físicos newtonianos.
Pois bem, a obra-prima de Walras abriu aos economistas os portões do paraíso, deixando como anjos caídos do firmamento científico historiadores, filósofos e sociólogos. A ponto de irmos ao outro extremo, o predomínio da forma sobre o conteúdo, o completo domínio de uma sofisticada linguagem matemática por gente que não tem o que dizer.
Esse pano de fundo é importante para explicar males econômicos atuais. Questões importantes mal abordadas e tolices defendidas “cientificamente” são fantasmas que assombram economistas de formação incompleta. Como puderam “cientistas” americanos, gente tão preparada aplicando cálculo estocástico em derivativos tóxicos, ignorar os visíveis excessos de expansão de crédito, especulação imobiliária e bolhas nos mercados de ações? E como puderam os bancos centrais, com modelos econométricos de última geração, estimular tais excessos, cometendo a tolice de manter juros tão baixos por tanto tempo, esperando o alarme inflacionário que também jamais se manifestou nos dois outros maiores crashes da História: em 1929 nos Estados Unidos e em 1989 no Japão?
Os economistas brasileiros levaram quase duas décadas para compreender a importância do Banco Central no combate à inflação e da flutuação cambial no ajuste das contas externas. Mas alguns ainda não compreenderam que o aumento ininterrupto dos gastos públicos eleva os juros e derruba o câmbio, destruindo empregos pela redução dos investimentos, pelo desestímulo às exportações e pela desindustrialização induzida por importações artificialmente baratas. Mas o maior de todos os pecados é o silêncio diante da arma de destruição em massa dos empregos brasileiros: os excessivos encargos sociais e trabalhistas.
Fonte: Jornal “O Globo” – 08/03/2010
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