O presidente Lula decidira pela compra de equipamento bélico francês antes mesmo de receber a opinião de especialistas das Forças Armadas quanto à conveniência técnica das opções oferecidas. O presidente havia decidido ainda não apenas a mudança do sistema de concessão para o regime de partilha na exploração do petróleo, mas também a redistribuição de recursos fiscais entre os entes federativos antes mesmo de consultar o Congresso e os Estados produtores.
A verdade é que as digitais do governo estão em toda parte. Agora mesmo, o Supremo Tribunal Federal está em vias de considerar ilegal a decisão do Ministério da Justiça de conceder refúgio político ao italiano Cesare Battisti, enquanto o ministro Tarso Genro considera uma prerrogativa do Executivo negar a extradição. Outro episódio de interferência do Executivo em assuntos de outros poderes foi a decidida atuação de Lula em defesa de José Sarney na crise do Senado.
É impressionante o espaço ocupado pelo governo em geral, e em particular pelo Poder Executivo, na mídia brasileira. Independentemente de as matérias serem ou não favoráveis ao governo, o volume de notícias assusta. As iniciativas, os eventos e o fluxo diário da vida social estão soterrados pela política, das boas notícias do pré-sal aos escândalos do Senado.
Pois esse é o resultado de quase 25 anos de domínio social-democrata na política brasileira. O PMDB, que disparou a corrida de ampliação e ocupação da máquina pública no governo de José Sarney, é acusado de cobrar “royalties” por sua criatura até hoje. O PSDB, que deu sequência à disparada dos gastos públicos de 20% do Produto Interno Bruto no regime militar para 40% nos dias de hoje, só reclamou do “aparelhamento” da máquina de administração pública quando foi deslocado de suas trincheiras. E o PT só entenderá o que está plantando quando, no movimento pendular da política, as urnas se deslocarem para uma versão populista de sua antítese. Basta imaginar Collor reeleito, com todo o poder atual da Presidência a sua disposição, se tivesse escapado de seu “mensalão”. Ou olhar um Berlusconi na Itália de hoje.
A verdade é que o vácuo na atuação do Congresso empurra o presidente da República para decisões em assuntos para os quais, com todo o respeito, não está preparado. A hipertrofia do governo federal é uma herança maldita do regime militar, equivocadamente acentuada pela inapetência por reformas de uma social-democracia hegemônica. A centralização excessiva do processo decisório contrasta com a prática desejável em uma democracia representativa: poderes independentes, muito bem assessorados e atuantes, decidindo de forma descentralizada em suas esferas. Os princípios em disputa são um processo decisório centralizado e desinformado contra um descentralizado e bem informado, com base em especialistas de excelência comprovada.
A propósito, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, no discurso de saudação aos alunos em volta às aulas, transmitido para todo o país, advertiu: “Cada um de vocês tem algo a oferecer. Sua responsabilidade é descobrir o quê. A educação lhes dará a oportunidade dessa descoberta. Não importa o que decida fazer de sua vida, eu garanto que você precisará de educação para fazê-lo. Quer ser um médico, um professor ou um policial? Quer ser uma enfermeira, um arquiteto, um advogado ou um militar? Você precisará de boa educação para qualquer carreira. Se você fugir da escola, não encontrará um bom emprego. Você precisa aprender, treinar e se esforçar muito. A responsabilidade que cada um de vocês tem por sua própria educação não é importante apenas para sua vida e seu futuro. Sua educação decidirá também o futuro deste país”.
É importante que crianças se preparem não apenas para desempenhar bem seu papel profissional, mas também porque poderão ajudar seu país nesse processo decisório descentralizado e bem informado que é a boa política. E uma delas será o presidente da República.
(Época – 14/09/2009)
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