Nas últimas semanas, começa a se delinear, de forma bem mais clara, a retomada da economia, mesmo ainda havendo controvérsias sobre sua intensidade. Na verdade, não só pela sua intensidade, mas também pelo rumo a ser tomado, ou seja, o que esperar para os próximos anos.
Neste caso, novos desafios acabam se tornando inevitáveis, visto que as mega medidas monetárias e fiscais, adotadas nos países ricos e, em menor intensidade, nos emergentes, devem perder eficácia em algum momento, tendo como reflexo economias pressionadas pela inflação de demanda, dado o grande volume de recursos injetado nestas economias. Isto pode ser visualizado pelas “curvas de juros” de longo prazo nos EUA, apontando para a “normalidade”, ou seja, taxas mais altas, em torno de 3,5% a 4,0% anuais. Com os traders forçando uma rolagem com “prêmios” mais altos para os treasuries norte-americanos, a pressão pela elevação do juro acabará inevitável, ainda mais com demanda aquecida pelas commodities agrícolas e as minerais, como o petróleo.
Sendo assim, a retomada da economia pode ser abortada lá na frente pela necessidade de uma “parada técnica”, via elevação de juro, para tentar evitar algum surto inflacionário, com a alta dos alimentos e do petróleo. Neste caso, a economia se recuperaria neste segundo semestre, até peder força ao longo do ano que vem, mergulhando numa outra desaceleração.
Na opinião de Nouriel Roubini, economista norte-americano, conhecido como Mr. Doom (ou Sr. Catástrofe), esta tese “ganha corpo”. Para ele, a retomada da economia global é uma realidade, mas a formatação desta trajetória de crescimento numa curva em “W” (dupla queda), a se consolidar nos próximos meses, vem se tornando uma hipótese plausível. Para ele, “assim que o efeito benéfico dos planos de retomada passarem, os Estados não terão outra escolha senão suavizar a retomada, cortando despesas públicas ou aumentando seus déficits”. Para isto, terão que adotar uma política de juros mais austera, diante da necessidade de segurar a demanda, até porque o barril de petróleo é muito sensível às variações de demanda.
Um fato considerado como um perigoso precedente nesta tese, veio da decisão do banco de Israel, na semana passada, ao puxar a taxa básica de juros em 0,25 ponto percentual, a 0,75% anuais, diante da preocupação com a inflação. Este foi o primeiro banco central a elevar o juro em resposta a indicações de que a economia global está saindo da recessão, a demanda está se aquecendo e a inflação ganhando força. Recentemente, a inflação por lá ficou acima da meta do governo, de 1% a 3%, sendo que em julho, foi a 3,5%. Por enquanto, nos EUA e na Zona do Euro isto não aconteceu, já que as decisões dos bancos centrais têm influência mais global. Mas em 2010 tudo é possível.
E o pior é que o Presidente do Banco Central israelense é o economista Stanley Fischer, ex-diretor do FMI, e considerado um dos principais expoentes do think-tank da nossa Ciência Econômica. Ele discorda quando falam em retomada, visto que “embora existam sinais de recuperação, ainda é cedo para dizer que a crise econômica acabou.” Por outro lado, Oliver Blanchard visualiza uma retomada, mas há vê de forma lenta e ainda errática, com efeitos ainda deletérios pelo meio do caminho, talvez preocupado com os excessos fiscais e monetários adotados e seus corolários mais à frente.
Alguns consensos, no entanto, são perceptíveis entre os economistas neste processo de retomada, não tão linear como antes previsto. Citemos três dentre os mais relevantes.
Esta retomada depende do reaquecimento do consumo das famílias, tradicional motor da economia norte-americana, representando 70% do PIB. Nesta crise, com o desemprego chegando a 9,4% da PEA e ameaçando ir a dois dígitos, o consumo vem se mantendo fraco, com a poupança voltando. Uma alternativa a esta fraca “propensão ao consumo” seria o aumento do driver exportador, em especial para a Ásia, mas eles se mostram mais interessados em exportar para os norte-americanos.
A tese de que “empresa grande não quebra” acabou ganhando espaço nesta crise, dado que os bancos, com exceção do Lehman Brothers, acabaram “preservados”, assim como as montadoras norte-americanas, como a GM, em recuperação judicial. Por fim, temos os desafios do enfrentamento dos déficits crescentes nos próximos anos, com o governo prevendo um rombo fiscal em torno de US$ 9,13 trilhões de 2010 para 2019.
Em resumo, a retomada da economia só se consolidará, se vier com o consumo das famílias acelerando, tanto nos EUA, como nos principais países da Europa e na China. É com esta variável, que a renda gerada, poderá estimular novos investimentos, o que tornaria esta retomada sustentável. Não acredito que a situação fiscal seja explosiva, mas será preciso um “freio de arrumação” no gerenciamento das contas públicas nos próximos anos.
Na China, temos uma economia retomando, crescendo, na média, cerca de 8%, mas alavancada pelos investimentos públicos, já que o consumo não possui renda suficiente para empurrar a economia. Neste sentindo, preocupa quando estas medidas fiscais adotadas na virada do ano passado para este (um pacote em torno de US$ 578 bilhões) começarem a perder fôlego. Como a economia chinesa continuará se movendo nos atuais patamares?
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