Por Otto Guevara Guth
Tradução do Espanhol: Álvaro Pedreira de Cerqueira
Palestra pronunciada no XXII Forum da Liberdade em Porto Alegre, com o tema ‘Cultura da Liberdade’, em 6 e 7 de Abril, de 2009. Realização do Instituto de Estudos Empresariais – IEE.
Otto Guevara Guth nasceu em 13 de outubro de 1960. Diplomado em Direito pela Universidade da Costa Rica e com MBA com ênfase em Negócios Internacionais pela National University of San Diego, Califórnia (campus da Costa Rica) e mestrado em Direito (LLM) com ênfase em Resolução de Conflitos pela Harvard University. É candidato a Presidente da Costa Rica nas próximas eleições.
(Nota do Trad.: Ele me disse que não tem qualquer parentesco com Che Guevara. Brincando, disse-me que é ‘El Otro Guevara’ , em trocadilho com seu próprio prenome.)
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Estamos em meio a uma crise financeira e econômica que abriu um debate sobre quais foram as causas da crise e como sair dela da melhor maneira.
Muitos culpam o mercado, a falta de regulamentação e o capitalismo, e se esquecem que esta crise tem sua origem precisamente no contrário: uma forte intervenção estatal nos mercados de hipotecas e na economia em geral, nos Estados Unidos da América. Em 1995 foi promulgada a lei de reivestimento comunitário, forçando os bancos, com garantia estatal, a conceder empréstimos às camadas populares de baixa renda.
Posteriormente, em 1996, foram emitidas diretrizes para que a Fannie Mae e a Freddie Mac, empresas ligadas ao governo, dedicassem uma grande percentagem de sua carteira de hipotecas a pessoas com menos recursos. Em 1997, uma alteração na Lei Federal de Crédito obrigou que a carteira de empréstimos daquelas companhias deveria atender as comunidades servidas através de critérios de raça, gênero e idade.
Posteriormente, a Administração Federal de Habitação criou um seguro para os bancos que financiavam hipotecas “sub-prime” (de segunda mão) a pessoas de baixa renda, que na maioria dos casos não tinham condições mínimas para fazer jús a crédito. Entre 2001 e 2003, o Federal Reserve Bank (Banco Central americano), sob a presidência de Allan Greenspan, baixou as taxas de juros para 1% ao ano.
Obviamente, essa medida fez disparar o consumo, sobretudo a aquisição de casas, o que causou inflação dos preços delas. Nessa época, o governo fez a Fannie Mae e a Freddie Mac aumentarem ainda mais sua participação no mercado de hipotecas, que chegou a quase metade desse mercado. Estas empresas compravam hipotecas de quase todos os bancos. Que eram então securitizadas e revendidas a bancos de investimento e fundos de pensão.
Eram títulos com garantia real, oferecendo renda mensal, com diversificação de risco, pagando juros superiores aos dos títulos do Tesouro americano, além de garantia de resgate da AIG, a maior seguradora do mundo. E contavam com boa qualificação da Standard and Poors, agência classificadora de riscos. Aquela bolha só podia estourar e foi o que aconteceu. A partir daí, as medidas do governo foram de mais intervenção, pondo mais dinheiro dos contribuintes para salvar empresas e bancos, além de mais regulamentação.
Infelizmente, a forma como a crise foi gerida só confirma esta prática tão comum nos países da América Latina, de privatizar os lucros e socializar os prejuízos. A conta dessas intervenções será paga por todos os americanos, mas também pelos habitantes de todos os demais países do planeta
Esta crise econômico-financeira está produzindo uma grave contração do comércio mundial. A Organização Mundial do Comércio – OMC estima que o comércio global diminuirá em 9% este ano, com a maior redução desde a Segunda Guerra Mundial. A redução na demanda de produtos e também a redução do fluxo de dinheiro explicam esse declínio do comércio mundial.
Além disso, também começam a aparecer medidas protecionistas em vários países, incluindo vários do G-20, apesar do fato de que em novembro passado tomaram a decisão de evitar o protecionismo. As vozes que pedem protecionismo estão se tornando cada vez mais fortes, apesar das advertências feitas por milhares de institutos liberais no mundo todo e por personagens como o Presidente do Banco Mundial Robert Zoellick, que advertiu que o isolacionismo dos países pode levar a uma espiral negativa de problemas económicos, tais como os experimentados na década de 30, o que faz a situação atual, em vez de melhorar, ficar cada vez pior.
Além disso, Primeiro-Ministro britânico, Gordon Brown afirmou recentemente que o protecionismo é o caminho para a ruína. Os cantos de sereia que são ouvidos fazem com que as pessoas acreditem que através do protecionismo — tarifário ou não-tarifário – garante-se a indústria local e continuará a se manter os empregos da nação, que de outra forma seriam exportados para “outros países”. Com a garantia do trabalho, as pessoas vão ter dinheiro para consumlr os bens das várias empresas locais, que terão melhores preços para os produtores e que o Estado vai criar os empregos necessários para proporcionar às demais pessoas o que elas precisam para viver.
O protecionismo também parte da premissa de que o estado é bom, que cuida bem de nós, que irá fazer de tudo para assegurar que todo o povo esteja bem na sociedade. Para proporcionar isso, o governo usa um monte de ferramentas, algumas das quais incluem: tarifas alfandegárias, barreiras não tarifárias ao comércio; regulamentos para todas as atividades econômicas, controle de preços no mercado e de lucros nas empresas, controle de câmbio e de troca de moedas; subsídios para a produção e o consumo, que aumentam a despesa pública, e que exigem mais emissão de moeda, ou um aumento da dívida pública, ou aumento de impostos, ou uma combinação destes instrumentos. Além da participação ativa do governo na economia como um ator, a gestão de empresas estatais, ou investir uma grande quantidade de dinheiro em obras públicas, para fins de contratação de muitas pessoas.
Apesar das boas intenções que tenham os que defendem o protecionismo, a realidade de suas consequências é muito diferente. Ao aumentar os impostos sobre as mercadorias importadas para proteger os produtos nacionais, os preços destes no mercado sobem. Ao aumentarem os preços das matérias-primas dos produtos nacionais que são exportados, eles perdem competitividade no mercado internacional e a demanda por eles diminui.
Também, com o aumento dos preços dos bens de consumo nacionais no mercado protegido, as pessoas terão menos dinheiro para comprar outros produtos, o que torna a procura destes reduzida. Ao isso acontecer, as empresas têm de despedir trabalhadores para não falir. Sobrevém o aumento do desemprego e a queda dos salários reais. O encarecimento das matérias-primas e os regulamentos que o governo impõe farão com que o ambiente para empreender piore bastante.
Haverá menos investimentos, tanto de capitais nacionais quanto estrangeiros, que buscarão países com ambiente de negócios mais favoráveis. Quando há menos investimentos no país, além de controle de preços e de lucros pelo governo, a consequência lógica de tais políticas públicas é a escassez. Com a escassez e o desabastecimento, cria-se o “mercado negro” com preços bem acima daqueles que poderiam ser encontrados em um ambiente competitivo.
Ao mesmo tempo que todas essas conseqüências se vão manifestando, formam-se grupos corporativos de pressão com seus interesses, em busca de proteção junto ao Estado: os sindicatos, que pretendem tornar mais rígidas as relações trabalhistas, grupos mercantilistas de falsos empresários que buscam apoio do poder público para lhes proteger da concorrência e facilitar a transferência de recursos da sociedade para eles. Esse ambiente é propício para que os políticos e burocratas criem dificuldades legais para vender facilidades e estão, assim, abertas as portas da corrupção.
Todas estas consequências resultam em que os indivíduos na sociedade vão perdendo os valores do respeito pela propriedade privada, o respeito pelos direitos dos outros, de que não se deve viver às custas dos outros, e de que temos de trabalhar honestamente para ganhar o próprio sustento. E aumentam os ressentimentos e tensões entre as classes sociais.
(Continua)
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