Autor Convidado: Claudia Costin
Escrevi recentemente neste espaço um artigo intitulado O problema é de gestão. Prossigo hoje com o tema, dadas a gravidade e a persistência do problema, tanto no nosso marco legal quanto nas práticas cotidianas de governos. Políticas públicas importantes são formuladas, obras vitais para resolver gargalos de infra-estrutura são concebidas e projetos sociais têm recursos reservados, mas esbarram em leis feitas para moralizar, mas não para assegurar uma adequada implementação e bons resultados. “No meio do caminho”, dizia Carlos Drummond há 80 anos, “tinha uma pedra.” E fomos nós que lá a pusemos, na tentação tecnocrática de sanar problemas de corrupção, inviabilizando a gestão.
Dia 28 de setembro o Estadão noticiava o atraso de obras previstas no PAC, num contexto em que disponibilidade de recursos ainda não é um problema. Será em breve, a persistir a ameaça de contágio da crise americana por aqui. A Usina de Belo Monte (PA), promessa de vários presidentes, ainda não teve sequer o relatório de impacto ambiental analisado pelo Ibama. A Usina de Jirau, com a estação de chuvas, provavelmente terá seu cronograma retardado em um ano. O edital do leilão da concessão das Rodovias BR-116 e 324, na Bahia, também sofreu atrasos. Por quê? Por falta de planejamento e de coordenação entre diferentes áreas de governo, combinada com uma legislação que dificulta a realização de projetos complexos, ou, em bom português, problemas de gestão.
Mas a má gestão advém também de outros fatores, como o imediatismo de alguns governantes e o clientelismo do sistema político. Por essas razões não se investe em profissionalizar a máquina pública, trazendo bons quadros que, como em qualquer empresa, possam gerenciar projetos complexos, controlar custos e assegurar resultados. Quadros que permaneçam quando governos mudam e, assim, assegurem continuidade e a memória de bons programas. Nesse sentido, merece aplauso a iniciativa do governador do Distrito Federal, que enviou à Câmara Distrital projeto de lei criando o cargo de gestor público, a ser provido via concurso, com salários competitivos. A intenção é que trabalhe em formulação de políticas públicas, acompanhamento de sua implementação e avaliação de metas. A carreira segue o exemplo do Estado de São Paulo, de Minas e do próprio governo federal.
Uma série de outras iniciativas vem sendo adotada para melhorar o desempenho da máquina pública em diversos Estados do País. Boa parte das medidas adotadas para reduzir custos e desperdícios e introduzir mais qualidade na gestão de políticas públicas resulta do apoio decisivo do Movimento Brasil Competitivo e, particularmente, do entusiasmo, financiamento e cobrança de Jorge Gerdau. Empresário competente, o maior produtor de aço do País, Gerdau é hoje incansável na busca de uma melhor qualidade da educação pública nacional e, cada vez mais, da modernização da gestão. Em entrevista recente ao Estado, Gerdau ressaltava que “os governos têm de enxergar que o caminho é a gestão”. Hoje13 Estados brasileiros estão se beneficiando dessas idéias.
Em Sergipe, Marcelo Déda investiu no corte de despesas e liberou, assim, recursos vitais para investimento, inclusive na modernização e informatização da máquina pública, dotando-a de mais agilidade e fortalecendo o Centro de Atendimento ao Cidadão. No Rio, recursos liberados com a moralização da folha de pessoal têm ajudado na informatização das escolas e das polícias. Em Minas Gerais, Aécio Neves, o primeiro a falar em choque de gestão, transformou um Estado que em 2003 apresentava uma das mais graves situações fiscais do País num dos mais eficientes, com as finanças saneadas, um grupo forte e valorizado de profissionais no serviço público, metas claras a atingir e remuneração associada ao desempenho.
O Estado de São Paulo, que estava bastante desfalcado de profissionais de carreira preparados para formulação e gerenciamento de políticas públicas, adotou há cerca de um ano uma carreira similar à que Brasília agora propõe. Estabeleceu também, em áreas importantes como cultura e saúde, parcerias com a sociedade civil na gestão de hospitais, teatros, orquestras e centros culturais. Esse modelo, questionado às vezes por não incluir cláusulas legais que, a pretexto de combater a corrupção, tornam esses setores quase inadministráveis, tem-se revelado muito eficaz e transformado as instituições que o adotam em órgãos de fato voltados para o público e com boa qualidade de serviço, segundo avaliações e auditorias externas.
Agora, o Estado começa a premiar desempenho de equipes nas escolas, com base no aprendizado das crianças, numa prática que deve ser estendida a outros setores. O exemplo, adotado por Minas e pelo Distrito Federal, premia professores e outros profissionais da educação em Roraima, Rio Grande do Sul e Tocantins. É importante lembrar, porém, que, se o Ministério da Educação não tivesse iniciado e mantido a mensuração da aprendizagem, dificilmente se poderia premiar o desempenho das equipes de escola.
A esperança que surge destas iniciativas estaduais é grande. A tentativa de dotar os governos de profissionais capacitados, com metas claras estabelecidas e remunerados com base em resultados, é um passo importante na melhoria da gestão pública. A revisão das despesas, com redução de desperdícios e melhorias no combate à sonegação, tem sido um passo adicional. Mas o que completa esse esforço é a integração das diferentes políticas num processo de planejamento de mais longo prazo, em que clientelismo e imediatismo sejam substituídos por profissionalização e por um projeto de país que possa crescer de acordo com os investimentos públicos e privados em educação, infra-estrutura e inovação.
(O Estado de S. Paulo – 6/10/2008)
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