No Brasil, o que desejamos que o Estado resolva? Basicamente tudo! É só consultar o art. 6° da nossa “Constituição Cidadã”:
“Art. 6o São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.”
Pretendeu-se construir aqui um legítimo “Estado de Bem-Estar Social”, em que tudo seria garantido pelo governo e viveríamos em um paraíso na terra.
Obviamente, há problemas. Nos raros países que conseguiram implantar de forma eficaz esse sistema, percebeu-se a existência de duas questões insolúveis: primeiro, as necessidades humanas são finitas e podem ser definidas de modo objetivo, mas os desejos são infinitos e subjetivos, nunca poderão ser satisfeitos, nem à custa de todo gasto estatal; aliás, esse mesmo gasto tem se mostrado insustentável em longo prazo, como se vê na questão previdenciária.
Além disso, a segurança dada pelo Estado faz com que os indivíduos não tenham estímulos para darem o melhor de si: de qualquer maneira haverá renda (mesmo que não se trabalhe), sistema de saúde gratuito (mesmo que voluntariamente se drogue ou se alcoolize), proteção à maternidade (mesmo se o filho for gerado de forma irresponsável, como acontece com as mães que não têm condições de criá-los) etc. Não importa o que você faça, o Estado lhe protegerá, ou seja, você não é o responsável por suas atitudes!
Há algumas conseqüências óbvias desse “excesso de segurança”: não há incentivos positivos (a ideologia oficial transforma a busca da riqueza em uma meta imoral) nem negativos (não é preciso fugir da pobreza já que o Estado sempre fornecerá auxílio) para que os indivíduos procurem, sistematicamente, melhorar seu nível econômico. Ora, se milhões de pessoas tendem à estagnação, imagine-se o efeito na economia de um país!
Mesmo se abstrairmos essas questões e considerarmos, por delírio, que a satisfação de todas as nossas necessidades é um objetivo não só possível, como desejável, a questão é se atingimos o tão propalado “Estado de Bem-Estar Social” no Brasil.
Serviço de saúde universal, previdência para todos, assistência social para milhões de famílias pobres, farto crédito imobiliário e agrícola, educação primária praticamente universal, amplo programa de bolsas para universitários carentes, etc, etc poderiam indicar que seguimos firmes nesse caminho.
Porém, não nos parece que essa indicação é tão segura: a saúde pública é universal, mas de baixíssima qualidade, qualquer um que possa paga um programa de saúde; a assistência social não retira as pessoas da pobreza, mas as mantém dependentes; o crédito é farto, mas caríssimo, para qualquer padrão de país civilizado; a educação está se universalizando enquanto que a qualidade do ensino cai ano após ano etc, etc.
O Estado quer fazer tudo e efetivamente o faz, mas a qualidade dos serviços prestados deixa muito a desejar. É como um açougueiro, que entende bastante de carnes, mas passa a lidar também com agência de viagens, floricultura e fabricação de robôs. Obviamente, deixará de fazer bem aquilo que é sua especialidade e exercerá as outras funções de maneira bastante precária.
Se pudéssemos escolher apenas uma dentre as infinitas possibilidades de atuação do Estado, não haveria dúvida: a segurança pública. Por mais eficientes que nós sejamos para prover nossas necessidades (saúde, educação, moradia, etc) não podemos defender a todo tempo nossos bens mais importantes, como vida, liberdade e propriedade. Mesmo os que têm bastante perícia no manejo de armas estarão desguarnecidos em algum momento (exemplo óbvio é o repouso noturno).
Essa é a finalidade primeira do Estado, descrito como Leviatã por Hobbes: evitar que nossos bens sejam lesados por agressões alheias. Mais do que qualquer coisa, trata-se de nossa sobrevivência.
Antes que exista o “Estado de Bem-Estar Social” é indispensável a simples existência de um Estado de Direito, em que as regras são devidamente cumpridas e os infratores têm a certeza da punição. A recente rebelião do Primeiro Comando da Capital (PCC) demonstra que ainda nem atingimos esse estágio: não há garantias para a vida, a liberdade e a propriedade das pessoas. Ora, a educação universal não tem muito sentido quando não se está vivo para recebê-la…
Conseguimos atingir um paradoxo: moradia, lazer e educação estariam garantidas, mas não a vida, a liberdade e a propriedade, que são pressupostos para a fruição de quaisquer outros bens da vida!
Mais ainda: todos esses itens prometidos pelo Estado por meio da Constituição são conferidos à população, no mais das vezes, de maneira precária e bastante ineficiente.
Desse modo, ultrapassamos o Estado de Direito, que nunca existiu aqui, e o “Estado de Bem-Estar Social”, do qual conseguimos fazer uma patética caricatura. Atingimos o “Estado Tabajara”, que, como os produtos veiculados pelo “Casseta e Planeta”, se propõe a resolver todos os nossos problemas, mas não soluciona nem aqueles para os quais ele foi criado.
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