Este título pode ser um pouco otimista, mas os sinais recentes das últimas semanas, inclusive dos mercados de ações, podem ser um indício de que estamos ingressando num período em que devem surgir mais indicadores de recuperação do que de perdas.
Nas várias pesquisas empíricas divulgadas sobre os movimentos dos mercados, observa-se um gap de seis meses para uma recuperação do mercado de ações antes da economia real. Sendo assim, as bolsas antecipam, ou já “precificam”, uma recuperação que só deve se tornar concreta num prazo de seis a nove meses. Por estes cálculos, portanto, não será surpresa se a economia real começar a mostrar sinais de alguma recuperação ao fim deste ano, mais precisamente no quarto trimestre. Ou seja, já dá para pensar numa inflexão ao longo deste ano, sendo fato, no entanto, que os países desenvolvidos e muitos emergentes devem fechar 2009 no vermelho, ou próximo a isto.
Daí surge e pergunta crucial neste momento: teremos uma recessão global neste ano? As evidências dos últimos indicadores mostram que sim. No entanto, qual será a profundidade deste processo? Sendo a incerteza ainda predominante, os sinais e declarações recentes dos agentes nos diversos mercados já mostram que esta recessão não será tão profunda e/ou prolongada, como antes pensávamos. Será?
No gráfico ao fim, já se pode observar um movimento de congestionamento entre o Ibovespa e o “risco Brasil”, numa sinergia que pode indicar uma tendência de alta. Aguardemos, portanto, os próximos sinais e indicadores das várias economias mergulhadas nesta crise.
Sobre os últimos acontecimentos, um arsenal de medidas importantes foram anunciadas na semana passada, como o detalhamento do pacote Geithner nos EUA, um amplo programa habitacional para camadas de baixa renda no Brasil e iniciativas concretas de um “repensar sobre o sistema financeiro global e seus mecanismos de regulação” na reunião do G20 nesta semana em Londres. Sobre estas, alguns comentários merecem ser feitos.
Pacote de habitações populares. Deve mobilizar cerca de R$ 34 bilhões, envolvendo as camadas de baixa renda, principalmente, entre três e dez salários mínimos, mas dúvidas permanecem sobre as origens destes recursos e o tempo de execução, assim como os meandros burocráticos no desenrolar dos projetos. Por outro lado, deve ser elogiado o foco deste pacote, mirando mais as camadas de baixa renda, mais necessitadas de subsídios governamentais e as principais vítimas do déficit habitacional hoje existente, entre 7,2 e 8 milhões de habitações.
Denominado “Minha casa, minha vida”, este pacote supõe ter recursos mobilizados no total de R$ 34 bilhões, sendo R$ 25,5 bilhões da União, R$ 7,5 bilhões do FGTS e R$ 1 bilhão do BNDES. Sobre os recursos do FGTS, a dúvida é saber se estes serão suficientes, dados os saques crescentes nos últimos meses com o aumento do desemprego. Já em relação aos recursos da União, os debates em torno do Orçamento Geral da União de 2010 não indicam haver disponibilidade para a execução destes projetos. De onde, então, estes recursos anunciados, em cerca de R$ 25,5 bilhões, serão mobilizados?
Devemos ressaltar que na semana anterior o governo havia anunciado um corte, ou contingenciamento, de cerca de R$ 26 bilhões para o ano que vem, numa resposta diante da perda de arrecadação recente, prevista em mais de R$ 40 bilhões para este ano. A impressão que se tem nestes pacotes governamentais, portanto, é de que são frutos do improviso e da intenção de impressionar a sociedade, visando as eleições de 2010. Serão, portanto, pacotes eleitoreiros?
Cremos que mais sensato seria o anúncio de medidas mais exequíveis e graduais, de acordo com o avanço dos acontecimentos e a disponibilidade de recursos. Assim, da forma que é feito, cheira mesmo a oportunismo eleitoral, sim. Resta saber se estes recursos e estes projetos se transformarão em realidade, não ficando no terreno das boas intenções.
Pacote Geithner. Duas medidas certeiras, anunciadas nas duas últimas semanas, podem reverter o clima de pessimismo no sistema bancário norte-americano: uma foi a compra de títulos de longo prazo pelo Fed, outra o detalhamento do pacote Geithner, anunciado no início de fevereiro, depois da posse do Presidente Barack Obama.
No primeiro, o Fed anunciou a compra de títulos do Tesouro de longo prazo (Treasuries Bonds), de 10 a 30 anos, no total de US$ 350 bilhões, e daqueles lastreados em hipotecas imobiliárias, no total de US$ 750 bilhões. Nesta operação de compra de títulos de longo prazo, o objetivo é derrubar a taxa de juros de longo prazo, tentando recolocar as pessoas na rota do consumo. Além de tentar antecipar o consumo futuro e desencorajar a poupança presente e futura, estas medidas tiveram por objetivo os refinaciamentos imobiliários, além de estimular os bancos a “destravarem o crédito”.
Sobre o pacote Geithner, detalhado nesta semana que passou, o objetivo é buscar, em parceria com o setor privado, com a criação de fundos público-privados, a depuração dos ativos tóxicos dos balanços dos bancos problemáticos. As instituições financeiras que quiserem se livrar destes ativos terão que identificá-los e submetê-los à análise do governo. Caso sejam aceitos, será realizado um leilão para que os investidores privados interessados em adquirir os ativos digam quanto estão dispostos a pagar. O governo deve entrar com garantias, na proporção de um para um, ajudando os fundos a se financiarem.
As dúvidas, no entanto, são duas: será que existe demanda para estes ativos podres ? Será que os bancos privados estão dispostos a expor suas fraquezas ao mercado, na colocação dos ativos podres para leilão por preço mínimo? Naturalmente, as instituições financeiras mais carregadas destes ativos passarão a ser vistas com desconfiança pelos mercados.
Por fim, se antecipando ao encontro de Londres dos 20 grandes (G-20), sobre a “reformatação de uma nova moldura para o sistema financeiro global”, a estratégia deve passar por quatro pontos:
1. Resolver o problema das instituições financeiras “grandes demais para falir”. Neste contexto, a supervisão deve ser mais estreita, visando o controle sobre operações com derivativos e hedge funds, controlando mais as operações dos grandes “bancos de investimento”, também sujeitos à regulação estreita, com transparência e fiscalização constante;
2. Reforçar a infraestrutura do sistema financeiro. Deve-se alertar sobre a fragilidade do setor de fundos mútuos de money markets. Os operadores de política econômica devem impor restrições rígidas aos investimentos destes fundos ou desenvolver um sistema de segurança para os fundos para que mantenham uma certa estabilidade nas suas rentabilidades;
3. Efeitos pró-cíclicos nos regulamentos dos balanços e fluxos de capitais. Estimular as instituições a facilitarem o crédito em períodos de boom e apertar o cinto nos períodos de crise. Neste contexto, as instituições devem rever seus posicionamentos para provisões e possíveis perdas;
4. Criação de uma agência governamental para a avaliação de “riscos sistêmicos”, entre outros. As crises globais requerem soluções globais, com os países devendo trabalhar de forma coordenada para estabilizar os sistemas financeiros. Daí a necessidade da criação de uma “autoridade sistêmica de risco”.
Enfim, estas medidas devem ser discutidas agora em Londres, assim como os vários pacotes anunciados nos vários países nos dão a esperança de que uma virada lenta da economia mundial deve começar a esboçar algum movimento ao longo deste ano, o que deve aplainar a profundidade da crise atual. Assim aguardamos, assim esperamos.
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