Humanos, demasiadamente humanos são os excessos, a falta de moderação, as ambições desmedidas. Essas manifestações ocorrem espontaneamente nos mercados, mas são também muitas vezes o resultado do destempero de governos. E as grandes catástrofes ocorrem quando erram todos juntos.
Na crise atual, as primeiras manifestações dessa falta de comedimento foram os excessos dos bancos centrais, das agências de crédito imobiliário e dos financistas anglo-saxões. Houve mesmo quem apressadamente anunciasse o último suspiro do capitalismo global.
Particularmente no Brasil, muita gente saltou de uma conveniente política fiscal contracíclica, com o governo gastando mais quando a economia está retraída, para a defesa de uma nova era de expansão permanente dos gastos públicos. Nada mais equivocado.
Uma coisa é o remédio de curto prazo: a economia americana, como também a brasileira, reagindo favoravelmente às políticas de reaquecimento da demanda prescritas por Keynes. Mas os novos sintomas da crise se manifestam agora exatamente no antigo paraíso da social-democracia europeia. Que por décadas não soube ou não quis enfrentar os gastos públicos exagerados, a rigidez de seus mercados de trabalho, os benefícios sociais abusivos e a vergonhosa discriminação contra imigrantes.
O euro trouxe, no início, crédito fácil e barato para todos. Mas, quando baixou a maré do crédito, apareceu quem nadava pelado. Os anjos caídos do paraíso, como Grécia e Portugal, não têm mesmo para onde fugir. Pois a disciplina fiscal imposta pela moeda única exige inapelavelmente a correção dos abusos.
A crise é por enquanto dos países com finanças frágeis, que não podem mais desvalorizar suas também frágeis moedas como instrumento de ajuste (diriam os gregos) ou como rota de fuga à disciplina exigida (diriam os alemães).
Adotando o euro, perderam sua taxa de câmbio como instrumento para correção de rumos. Terão de recuperar suas finanças públicas sob a terrível ameaça de deflação. Os alemães se recusam a financiar a farra dos gregos.
Mas terão de pagar impostos para salvar seus próprios bancos em caso de calote da dívida grega. Por isso são tão prestativos os franceses.
Mas, por baixo do véu da moeda única, são insustentáveis os fundamentos econômicos do paraíso social-democrata europeu, como será amplamente demonstrado nos próximos anos pelo suplício de gregos, portugueses e outros mais.
Fonte: Jornal “O Globo” – 03/05/2010
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