Época – Edição 468 – 12/05/2007
O Ibovespa já circunda os 50 mil pontos, há quem fale nos 60 mil, marcas extraordinárias, que não se cogitava alcançáveis sem vigorosas reformas e grandes consertos nas empresas como também nas estradas, na nossa combalida infra-estrutura, especialmente energética, e mormente no chamado ambiente de negócios: temos uma rica legislação trabalhista, mas não propriamente uma “capitalista”, até pelo contrário, alguns dirão, a propósito da legislação tributária …
O fato é que estamos chegando lá bafejados por fortíssimos ventos benignos vindos do exterior, fazendo crer que está muito fácil para qualquer país “chegar lá”, mesmo aqueles meio preguiçosos em todas essas provas de esforço necessárias para a prosperidade econômica no mundo globalizado. O leitor deve entender que o “chegar lá” tem um significado muito objetivo. Uma de suas manifestações é a elevação do preço dos títulos representativos da dívida externa brasileira, fenômeno que costuma ser lido “de cabeça para baixo”, ou seja, diz-se que caiu a taxa de retorno interna desses papéis, conhecida pela designação “Risco Brasil”. Esta é um das principais métricas do “crédito da nação”, para usar um termo pomposo.
Com efeito, o “Risco Brasil” alcançou a marca histórica de 150 pontos, ou 1,5%, com isso indicando que o Brasil pode tomar recursos no mercado internacional a um prêmio de risco apenas 1,5% superior ao do Tesouro Americano. Esse número já foi 20%, ou 2 mil pontos, em setembro de 2002. Bom para a nossa auto-estima, mas se notarmos que algo semelhante se passa com países como o Peru (120 pts) e Colombia (150 pts), para não falar dos números para a Argentina (240 pts) e Venezuela (220 pts), a sensação só pode ser a de que os mercados reduziram sua propensão ao risco indistintamente. E talvez só recuperem a capacidade de enxergar a diferença quando alguém sacudir a árvore e ver alguns frutos tombarem.
O leitor deve ter claro que o “Risco Brasil” é um número dado pelo mercado; existem medidas, digamos, mais “fundamentalistas” para o risco soberano, como as proporcionadas pelas agências internacionais de classificação de risco. Estas agências especializadas (Moodys, Standard & Poors) são pouquíssimo conhecidas do grande público, mas ocupam papel crucial no mercado de capitais globalizado, vez que funcionam como “gate keepers” (guardiãs dos portões). Elas possuem escalas, como as notas das escolas americanas, em letrinhas, mas que funcionam como uma nota de zero a 10. Essas escalas não medem pujança econômica, competitividade, liberdade, potencial de crescimento, nada disso: seu foco é a capacidade, e também a disposição, de um país de pagar suas dívidas, ou seja, medem solvência.
O Brasil tem uma nota ruim nesse quesito, um quatro. O histórico do governo em matéria de cumprir suas obrigações, não apenas dívida mobiliária, mas precatórios, dotações orçamentárias, empréstimos compulsórios, não é propriamente a esquadra inglesa.
Diz-se que os países com notas maiores que cinco atingem o chamado “grau de investimento” (GI). Não se trata aqui apenas de concurso de beleza, a conseqüência material relevante de um país atingir esta status é que a grande maioria dos maiores investidores do mundo – os fundos de pensão americanos, por exemplo – não podem, pelos seus estatutos, comprar papeis de países ou empresas que não têm o GI. São muitos bilhões de dólares de diferença, é como passar para a primeira divisão, tendo disputado a terceirona durante toda a sua existência.
As agências têm sido mais cautelosas que os mercados, aliás, como é seu costume. Seus funcionários emitem avisos discretos sobre a importância de reformas e coisas desse tipo para alterar qualitativamente as perspectivas econômicas, das quais decorrem as condições de solvência. Todavia, com a enxurrada de dólares, as reservas crescendo como estão, e as finanças públicas se agüentando, será difícil que as agências resistam aos mercados, que já antecipam, em parte, os efeitos do GI. Não chega a ser um almoço grátis, mas está muito baratinho..
No Comment! Be the first one.