Há momentos na vida de qualquer pessoa que de tão intensos, significativos e improváveis, parecem mágicos. Podemos estar, por exemplo, trabalhando num projeto, tentando desvendar seus caminhos, ultrapassar suas dificuldades, aumentar suas chances de sucesso quando, de repente, descobrimos por acidente um outro grupo que, sem ter a menor idéia de nossa existência, caminhando por outras vias desconhecidas, está querendo chegar ao mesmo lugar. Pode ser que ambos chegássemos lá de qualquer maneira. Mas fatores insondáveis cruzaram nossos caminhos e, um se alimentando da força do outro, um completando o que falta ao outro, avançamos mais rapidamente e podemos, até mesmo, ir bem além do objetivo inicial. Este momento mágico pode acontecer com uma pessoa, com um grupo, com uma comunidade, com um país. Um conceito fundamental incorporado ao linguajar globalizado nos últimos anos é o de “tipping point”, elaborado por Malcom Gladwell, um dos mais importantes jornalistas americanos da atualidade, do Washington Post e da New Yorker. Talvez a melhor tradução portuguesa para a expressão seja “ponto de mutação” e se refere àquele momento em que idéias, percepções de formadores de opinião e comportamentos sociais atravessam um limiar e se espalham aceleradamente, de uma forma que era quase impossível de prever anteriormente. Por conta de caminhos que se cruzaram inadvertidamente, estivemos no lançamento do Quero Mais Brasil em São Paulo, no dia 9 de março. Trata-se de um movimento com uma plataforma de transparência fiscal, choque de gestão pública e segurança jurídica de investimentos nacionais e estrangeiros. Será um ponto de mutação? Por sua abrangência, pelo tamanho do apoio conquistado, pelo entusiasmo de todos os que deram depoimentos no bonito e emocionante lançamento, é possível que sim. O Quero Mais Brasil parece sintetizar uma série de tendências econômicas, sociais, políticas e culturais que foram se processando nas profundezas do tecido social brasileiro durante um longo período. Há várias razões pelas quais poderíamos entender este momento como o ponto de mutação na dinâmica social, política e cultural do Brasil, entre elas: 1. A estabilidade monetária já dura 12 anos. Pela primeira vez na história, criou-se uma consciência de contribuinte em vastos setores da população brasileira. Ela é requisito fundamental de uma democracia de mercado e foi o lema da revolução da independência americana (“no taxation without representation”) – decisiva na constituição da economia de mercado moderna. Por outro lado, o crescimento da carga tributária nesse período, de 26% a 38% do PIB, foi gerando um mal-estar crescente na população, com o tamanho e a qualidade do gasto público. 2. A economia brasileira cresce a uma taxa baixa desde 1980, comparada com o crescimento acelerado do período 1965-1979, e com o crescimento muito superior dos países emergentes bem sucedidos, nos quais o Brasil se espelha. Uma parte importante da população sente-se, assim, perdedora no jogo da vida. 3. Apesar da baixa qualidade média da educação, a expectativa de prosperidade da população têm crescido sistematicamente devido ao aumento do nível educacional e da exposição à dinâmica de outras sociedades, derivada da intensificação da globalização, particularmente das comunicações. Temos hoje indivíduos mais informados, mais autônomos e mais dispostos a considerar a construção de sua carreira com um elemento fundamental do sentido de suas vidas. 4. Tem ficado cada vez mais claro para as classes A, B e C (mas também partes da D e da E) o alto custo da política: altos salários dos políticos e assessores, máquinas eleitorais clientelísticas, oportunismo, corrupção, insensibilidade e lentidão para enfrentar os problemas. Os escândalos de corrupção de 2005 tiveram um papel decisivo para mostrar o caráter disfuncional e ineficiente do sistema político. 5. Como em todos os países desenvolvidos e emergentes, na última década, a Internet e o telefone celular vêm se tornando instrumentos fundamentais para a formação e agregação de preferências entre os membros das classes A, B e C, dando aos indivíduos maior poder sobre os políticos e lideranças tradicionais. Em vários países, a internet tem sido um elemento fundamental na eclosão de movimentos de reforma econômica e política. Isso não tinha acontecido no Brasil até agora, inclusive contra a opinião de muitos analistas que o consideravam provável por volta de agosto de 2005 quando o escândalo do mensalão se aproximou fortemente do presidente da república. A internet, o telefone e cédulas em lojas por todo o país são as formas pelas quais o povo será chamado a dizer por que quer mais Brasil. Como disse Jorge Gerdau Johannpeter em sua fala de abertura do evento de lançamento do movimento, cada cidadão tem três formas de cumprir sua responsabilidade social: exercendo seu ofício, colaborando com sua família e comunidade e se comprometendo na luta por um país melhor que deixará para seus filhos. É a tarefa de cada indivíduo. Mas quando é o caso de um ponto de mutação, a força de cada indivíduo que arca com sua responsabilidade pode trazer finalmente o presente para um país que sempre se considerou do futuro, mas não quer mais esperar.
Quero Mais Brasil: o ponto de mutação
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