Foi dada a largada para as eleições de 2010, com os candidatos se movimentando. Sobre isto e o momento atual da economia brasileira, uma palestra interessante, promovida pela FGV-RJ, com o cientista político Amaury de Souza, o economista Marcelo Nery, falando sobre políticas sociais, e o economista-chefe do Santander Alexandre Schwartzman, projetando cenários econômicos, acabou lançando novas luzes sobre as perspectivas para este ano, alguns fatos relevantes sobre a mobilidade sócio-econômica do País desde 2003 e as tendências político-eleitorais para este ano.
* É consenso para todos que a economia brasileira deverá crescer entre 5% e 6% neste ano, dado o potencial de expansão da demanda doméstica, puxada pelo consumo das famílias, com o crédito passando de 45% do PIB, a recuperação da renda e o nível de emprego. Preocupa, no entanto, a falta de consistência deste crescimento, visto que embora haja uma boa recuperação dos investimentos estes respondem com o crescimento da demanda de forma defasada. Sendo assim, o País deve crescer até 6%, mas o seu potencial é de apenas 4,5%. Com isto, será inevitável uma “sintonia fina” por parte da política monetária do BACEN. Uma elevação da taxa de juros na próxima reunião do Copom agora nos dias 27 e 28 de abril é consenso, só havendo dúvidas sobre sua intensidade. Um ciclo de aperto monetário deve perdurar até o terceiro trimestre deste ano, com elevação de 2,5 pontos percentuais, até fechar o ano em 11,25%.
* Nas contas públicas, o governo continua com um ritmo de crescimento “anormal” das despesas de custeio, embora os investimentos públicos também estejam reagindo. A meta fiscal do governo para 2010 é ambiciosa (3,3% do PIB), ainda mais quando se tem uma eleição no meio do caminho. Somado a isto, o Tesouro segue capitalizando os bancos públicos, o que jogou a dívida bruta federal a mais de 63% do PIB em fevereiro passado.
* Sobre as contas externas, a deterioração da balança comercial, o aumento das despesas com remessas de lucros e dividendos, fruto do maior volume de investimentos externos, e o aumento das despesas com juros, devem pressionar o déficit em conta corrente em 2010. As projeções do mercado variam entre US$ 40 e US$ 50 bilhões, podendo ultrapassar os 3% do PIB. O que consola, no entanto, é que esta deterioração mostra uma melhor composição, caso comparemos o passivo externo atual com o dos anos 90. Neste período, eram os encargos das dívidas, ou seja, os juros, que pesavam na trajetória do déficit externo. Neste ano, na sua maioria, este passivo vem do aumento das despesas com dividendos e remessas, sinal do incremento dos investimentos externos diretos. Somado a isto, as reservas cambiais, hoje em torno de US$ 243 bilhões, acabam se tornando um seguro a mais contra apostas especulativas dos investidores externos.
* Nas transformações sócio-econômicas ocorridas no País desde 2003 até 2008, observa-se a ascensão de uma nova classe média, a chamada “classe C”, hoje a maior do País, equivalente a 51% da renda do Brasil. O “centro difusor” desta nova classe vem do Nordeste, em função da estabilização da economia e as políticas de transferência de renda adotadas pelo governo Lula, com as regiões Sul e Sudeste não apontando grandes ganhos de renda. Nesta década houve de fato uma melhoria na distribuição de renda, com os 10% mais pobres passando a deter 15,2% da renda nacional em 2008, contra 10% em 2003; os 10% mais ricos passando de 50% para 43,2% e os intermediários, de 40% para 41,6%.
* Continuando, entre 2003 e 2008 a “classe E” “perdeu” 19,45 milhões de brasileiros e a “classe D” 1,48 milhões. Já a “classe C” ganhou 25,89 milhões de brasileiros e as “classes A e B” 6,08 milhões. Na opinião de Marcelo Nery, este período, entre 2003 e 2008, acabou conhecido como a “pequena grande década”, marcado pela forte redução da desigualdade e a formalização do mercado de trabalho. Outro indicador relevante é de que grande parte desta melhoria veio da reinserção de segmentos sociais no mercado formal de trabalho. Segundo dados divulgados por Nery, 66,8% da melhoria de renda vieram do trabalho, 15,7% da Previdência, 17% dos programas assistenciais como “Bolsa Família” e 0,5% das transferências privadas.
* Mas será esta melhoria na distribuição de renda sustentável no longo prazo? Apenas transferindo renda não haverá crescimento sustentável na economia brasileira nos próximos anos. Não adianta “dar a vara se não ensinar a pescar”. Ou então, usando outra metáfora, é preciso haver uma porta de saída. Dar renda adicional pode apenas gerar uma dependência maior do Estado. É preciso estimular as pessoas de baixa renda a estudar mais e a melhorar sua vida com trabalho. Um fato interessante é que o Brasil se torna peculiar, quando os governantes se orgulham de dar 14 milhões de bolsas famílias. O ideal é que eles dessem cada vez menos, com a melhoria na distribuição de renda ocorrendo pela maior oferta de empregos formais. Portanto, será importante que o próximo governo realize reformas microeconômicas essenciais, como a trabalhista e a tributária, assim como busque desintoxicar nosso ambiente de negócios, tornando-o mais amigável, tanto para os grandes investidores externos e internos, como para os pequenos empreendedores.
* Sobre o cenário político, cresce a possibilidade de termos uma eleição polarizada neste ano, já que os dois primeiros candidatos devem concentrar mais de 70% dos votos. A corrida eleitoral, obedecendo ao calendário, começou mesmo agora no dia 03/04, embora o candidato governista já viesse sendo turbinado pelo presidente há muitos meses.
* No mapeamento político da eleição de 2010, a maior parte do eleitorado, cerca de 60% se concentra em São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Bahia, Minas Gerais e Pernambuco. Neste espectro, o candidato do PSDB deve ter maioria nas regiões Sudeste e Sul, com estreita vantagem no Centro Oeste, e a aliança PT/PMDB deve se concentrar mais no Norte-Nordeste. Isto nos leva também a outra conclusão esclarecedora: 61% do eleitorado possuem escolaridade baixa, com limitações no acesso às informações e no processamento destas.
* A ausência de uma agenda propositiva nos dois principais candidatos assusta um pouco neste início de caminhada eleitoral. A candidata do Presidente Lula se preocupa apenas em atacar a gestão anterior, do governo FHC, e o candidato da oposição se mostra tímido e silencioso. Um debate, que deve esquentar, diz respeito à presença do Estado na economia. Neste caso, é preciso resgatar a herança de John Maynard Keynes, economista inglês, que dizia que o papel do Estado seria atuar na superação das crises de demanda efetiva e na regulação (ou normatização) das economias de mercado. Fora isto, caímos apenas no esforço de se manter no poder e no controle da ineficiente e excessiva máquina pública.
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