Especialistas e ONGs concordam com a ineficácia dos embargos e o “impacto fatal” que causam na população
O presidente dos Estados Unidos Barack Obama aprovou na última quinta-feira sanções econômicas contra a Rússia e ameaçou com um “isolamento político” se as tropas do presidente Vladimir Putin continuarem a se apropriar do controle da península da Crimeia, na Ucrânia. Durante as últimas duas semanas, a União Europeia hesitou em impor sanções ao regime do ex-presidente ucraniano Victor Yanukovich. E, ao mesmo tempo, o bloco abria a porta a uma nova via de relações bilaterais com Cuba. Há uma mudança na política de embargos? Essas medidas atingem seus fins? Quem é prejudicado pelas sanções?
O objetivo dos embargos internacionais econômicos é “mudar o comportamento dos regimes autoritários para melhorar a situação do país”, segundo a UE. Mas os pesquisadores e as ONGs de direitos humanos consultadas — Human Rights Watch e Anistia Internacional — concordam que, com exceção da África do Sul, onde as sanções de 1987 contribuíram para terminar com o regime racista do apartheid, essas medidas não são só a causa de um “impacto fatal” na população, como também não são eficazes para alcançar seus objetivos.
Desde 2008, no entanto, esses isolamentos foram aperfeiçoados e ficaram conhecidos como “sanções inteligentes”, afetando apenas determinados cidadãos e empresas. Dessa forma, pretende-se evitar o sofrimento indiscriminado da população. Atualmente são 22 os países alvos de sanções inteligentes por parte da ONU, segundo o Sanctionsapp, um aplicativo desenvolvido por uma equipe da Universidade de Brown, nos Estados Unidos, e do Graduate Institute, Suíça.
— Ninguém se beneficia com as sanções internacionais — afirma Daniel Keohane, diretor de Pequisa do Fride, um centro de pesquisa europeu sobre política externa.
Ele sustenta, convencido, que “a outra opção é a guerra”, tese compartilhada por quase todos os especialistas consultados:
— A única razão para a imposição de sanções é evitar uma intervenção militar no país.
As sanções econômicas existem desde o ano 433 a.C, quando Péricles, pouco antes de começar a primeira guerra do Peloponeso, impôs o decreto de Megara pelo qual os mercadores foram excluídos do comércio de Atenas. O motivo: os megareses supostamente haviam ocupado terras sagradas para serem cultivadas. A economia foi colapsada.
Mas somente 25 séculos depois, a partir de 1960, esse ato de “violência econômica” se tornou popular, segundo Carlos Espósito, catedrático de direito internacional público da Universidade Autônoma de Madri. Os Estados Unidos, para punir o regime comunista de Fidel Castro por expropriar terras e bens de cidadãos americanos na ilha, impôs de forma unilateral um embargo econômico ao país caribenho que dura até hoje. Em Cuba, a escassez de equipes médicas em hospitais e medicamentos segue afetando os habitantes que sofrem os efeitos “desastrosos” das sanções, de acordo com a Human Rights Watch. Já somam-se 54 anos de castigo, e o regime castrista perdura.
— As sanções podem ajudar a flexibilizar alguma política, como o enriquecimento de urânio do Irã ou interromper o programa de armas químicas que o já falecido Muamar Kadafi desenvolvia na Líbia. Mas, para promover a democracia, tem sido um completo fracasso. A população é que sofre todas as consequências — comenta Richard Younghs, ex-diretor da Fride.
Mas as sanções econômicas não acabaram com o regime castrista em Cuba, nem com Muamar Kadafi na Líbia.
No último dia 20 de janeiro, a política externa do Irã experimentou um dos maiores pontos de inflexão. Os Estados Unidos e a UE fizeram uma declaração de intenções e anunciaram o início da retirada de algumas das sanções econômicas que pesavam sobre o regime desde a Revolução Islâmica, em 1979. A decisão foi uma compensação ao avanço das negociações sobre a suspensão do programa nuclear do presidente iraniano Hassan Rouhani.
O Vietnã é a outra face da moeda. O país asiático sofreu um bloqueio americano durante três décadas (1964-1994). Mas a decisão do ex-presidente Bill Clinton em propor o fim dos embargos significou a decolagem do país que, anos mais tarde, se converteu em uma economia competitiva.
— Os embargos não têm sido eficazes para derrotar os regimes e ditadores — argumenta o pesquisador do Peterson Institute Gary Hufbauer e também autor de Economic Sanctions Reconsidered (Sanções Econômicas Reconsideradeas, em tradução livre).
Em um país embargado, os cidadãos se veem desprovidos dos instrumentos mais básicos para a sobrevivência: medicamentos, acesso à água potável, material de construção, alimentos, eletricidade. É o caso da Faixa de Gaza, que sofre um duro bloqueio israelense desde 2006.
— Além do mais, os produtos encarecem e os mais vulneráveis (doentes, idosos e desempregados) não podem enfrentar (a situação) — explica Reinhard Lamfuss, da Anistia Internacional.
Mas alguns pesquisadores como Keohane, o consolo é que “ao menos não estão em guerra”. Trata-se, ele defende, de a “menos ruim” das opções.
Sussane Gratius, especialista em América Latina, acredita que as sanções econômicas “não são um instrumento que sirvam para promover a democracia”. O governo, contra o qual as medidas se destinam, com poucas margens de manobra, atribui a opressão de seus cidadãos aos embargos.
Fonte: O Globo
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