Com Eduardo Viola. Jovens franceses reagiram fortemente à lei que daria maisflexibilidade ao mercado de trabalho e que prometia reduzir o desemprego que os atinge em mais de 20%. Que relação tal comportamento tem com a lenta decadência que a França vem vivendo há mais de duas décadas? O capital herdado pela França de hoje — além de setores capitalistas modernos da economia, um capital histórico e natural que rende os ganhos advindos do turismo – permite que o francês mantenha um padrão de vida alto, mas não o convida a trabalhar duro para preservar o capital que, assim, vai sendo consumido. E ele reage às mudanças para manter as aparências. O francês vem se agarrando ao passado, com medo de encarar as reformas necessárias para crescer num mundo que vive profundas transformações e onde a competitividade de todas as economias desenvolvidas é permanentemente desafiada pelo crescimento acelerado de muitos países emergentes. A França é o país da Europa que fez menos reformas pró-mercado. É uma sociedade bloqueada, com pouca mobilidade social, desde meados do século passado, e uma economia com um grau de estagnação capaz de minar o próprio Euro. E luta para preservar o modelo estatista – um Estado forte, que intervém no mercado, que é proprietário de grandes empresas e promotor de uma política de amplos benefícios para trabalhadores do setor público, aposentados e desempregados. Ao contrário da tendência dos países que se modernizaram, como Reino Unido, Irlanda, Espanha e Finlândia, a França aprofundou ainda mais o sistema de privilégios para os trabalhadores, como no caso da redução da semana de trabalho. É aquela história, enquanto o indiano quer trabalhar 35 horas por dia, o francês quer trabalhar 35 horas por semana. E, agora, diante da oferta de liberdade, que diz “construa o seu destino, ganhando ou perdendo”, o jovem, numa atitude reacionária, responde: “não, prefiro preservar as garantias do passado, prefiro segurança mesmo que seja cada vez mais ilusória”. Embora exista uma minoria de jovens empreendedores que aceita riscos e faz progredir empresas, o francês médio ainda não acordou para o gritante fato de que ele não mais compete dentro de suas próprias fronteiras protegidas, mas com as dezenas de milhões de trabalhadores chineses e indianos que entram anualmente na economia global. O Brasil sofre da mesma miopia até por uma relação intelectual forte com a França. Somos um país paradoxal: temos, de um lado, parte do setor empresarial moderna, cada dia mais independente dos favores governamentais e aberta ao desafio da competição global, identificada com uma minoria de intelectuais de influência anglo-saxônica; e, de outro lado, uma imensa maioria da intelectualidade identificada com o modelo francês, que acredita no Estado como o principal gerador da riqueza e agente transformador. Mas o Estado brasileiro – caracterizado por inchaço, baixa eficiência, sonegação fiscal, alta corrupção e leis que se pretendem perfeitas em contraste com a realidade de precária implementação delas – é muito pior que o francês, em que o funcionalismo é eficiente, a sonegação e a corrupção são baixas e as leis são cumpridas. Como na França, a sociedade brasileira está estagnada, presa à mentalidade que sufoca a iniciativa privada, que dificulta a modernização das instituições econômicas e políticas, imprescindível para seguir o caminho das democracias de mercado consolidadas. Chile, Espanha e Portugal, para ficar apenas no mundo ibero-americano, trilharam o caminho. O francês pode continuar por muito tempo em lenta e feliz decadência, com elegância e prazer de andar pelas ruas, até porque esse prazer é o mesmo que terão cada vez mais turistas chineses e indianos que visitarão a França com o dinheiro que reduzirá os efeitos da paralisia imposta pelo modelo estatista. Nada é certo para a imensa maioria dos brasileiros, formados desde o ensino fundamental, por professores com que rejeitam ou desconfiam do capitalismo e se iludem com um mundo utópico em que o estado é o grande provedor de conforto, segurança, certezas para o futuro, até a velhice com aposentadoria garantida. O cidadão abre mão de sua liberdade para que Estado dê o que o Estado nunca dá. E quando o Estado falha, ele concorda em ter mais Estado. A França pode se dar ao luxo de se prender a um passado glorioso enquanto durar a glória, mas no Brasil a prisão criada pelo modelo estatista só implicará mais miséria, incerteza, distribuição de renda do pobre para o rico e estagnação. Se não tivermos a coragem de fazer as mudanças institucionais imprescindíveis – diminuindo a presença do estado, enxugando e tornando mais eficiente seu funcionamento, reformando a legislação trabalhista e previdenciária, priorizando o ensino público primário e secundário sobre o universitário, fazendo a reforma política que diminua o poder e os privilégios dos políticos, reduzindo a tolerância com qualquer crime a zero – estaremos condenados à estagnação e decadência como a França, mas ao contrário dela, à estagnação na pobreza e sem nenhuma elegância.
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